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O Espermograma

Zona de conforto, como o próprio nome diz, é confortável. É aquele ambiente em que dominamos, é aquele assunto que entendemos, é aquela situação com a qual sabemos lidar. Quando estamos em nossa zona de conforto temos total controle sobre as coordenadas. Estamos em CNTP (Condições Normais de Temperatura e Pressão)! Então melhor seria nunca sair da zona de conforto, não é? Não! Precisamos sair da zona de conforto se quisermos evoluir. Precisamos sair da zona de conforto se quisermos nos testar, se quisermos aprender algo novo. Se quisermos nos desafiar! Sem desafios e coisas novas, impera a mesmice. Sem desafios não evoluímos. Para ensaiar esta saída da zona de conforto, todos nós deveríamos fazer algo que nos dá medo, vergonha ou uma certa dose de constrangimento. Só para treinar, só para se preparar, só para bagunçar nossa adrenalina. Eu mesmo já saí várias vezes da minha zona de conforto. Saio dela sempre que falo em público (detesto, me dá tremedeira), sempre que sou o centro das atenções (detesto, quero cavar um buraco e me esconder) e sempre que faço algo que julgo constrangedor. E, para provar que sou capaz de sair da minha zona de conforto também aqui nas minhas crônicas mensais, resolvi falar do dia em que eu saí de casa para fazer um espermograma, assunto que até hoje me deixa um pouco ruborizado!

Tempos atrás, entre o nascimento de minha filha mais velha e o nascimento do meu caçula, minha esposa sofreu dois abortos espontâneos e o médico passou para ela uma série de exames, com o intuito de descobrir o motivo dos mesmos. Falou também que eu deveria fazer um espermograma, só para descartar qualquer problema quanto à “qualidade” dos meus espermatozoides. Minha primeira reação foi me agarrar à minha zona de conforto, regatear e resistir ao máximo, alegando idiotices como “melhor esperar primeiro os exames dela” ou “já tenho uma filha, logo meus espermatozoides estão normais”. Contudo, a consciência pesou e resolvi fazer o tal exame, depois de minha mulher garantir que a clínica para onde me mandaria era especializada nesse tipo de exame e bem discreta. O médico, contudo, ao escrever o nome da clínica, confundiu-se e colocou o nome de outra com grafia parecida. Deu-me o endereço da clínica (a errada) e me despachou para lá, cedo da manhã. Cheguei e estranhei: o balcão de informações estava lotado e não parecia nem um pouco discreto. Perguntei, quase sussurrando, para a senhora que ali estava, se eles faziam espermograma. A mulher respondeu, como se tivesse um megafone na boca: “ESPERMOGRAMA? FAZ, SIM. SANDRA, AVISA O DOUTOR QUE TEM UM RAPAZ AQUI QUERENDO FAZER ESPERMOGRAMA. MEU FILHO, SENTE ALI E ESPERE”. Sentei em um banco, sob o olhar divertido de cem pessoas, peguei uma revista qualquer, do século passado, e enterrei na cara.

Passados dez minutos, quando o povo já havia esquecido minha presença, abre-se uma porta e sai um médico bem velho, dando escândalo e gritando como um surdo terminal: “FRANCISCA, CADÊ O RAPAZ DO ESPERMOGRAMA”? Chica apontou para mim, com cara de sadismo. O médico veio, entregou-me um vidrinho para coleta do material e mostrou-me o banheiro que, claro, ficava no centro da sala de recepção. Ia entrando no banheiro, já disposto a acabar logo com aquele sofrimento, quando o médico gritou: “HI, A MENINA NÃO LIMPOU AINDA O BANHEIRO. ESPERE MAIS UM POUCO, QUE ELA VAI PASSAR UM PANO”. Disse que não precisava, entrei no banheiro rapidamente e tranquei a porta. Respirei fundo por cinco minutos, achando que não conseguiria ter uma ereção nem dali a dois anos. Consegui (com a ajuda do pensamento, diga-se de passagem, já que lá não havia revistas ou coisas assim), colhi o material, saí da porta (todos estavam olhando, com ares de expectativa), entreguei o vidro para a recepcionista e saí da clínica. Liguei para minha esposa, perguntei se ela sabia o que significavam as palavras discreta e especializada e disse que não iria pegar coisa nenhuma de resultado.

Ela foi pegar. Meus espermatozoides, apesar dos pesares, estavam perfeitos! E eu tive mais uma vivência prática sobre sair da zona de conforto!

Sérgio Idelano

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