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Somos o menino que fomos

Quero começar esta crônica dizendo que acredito piamente no título aí acima! O menino que fomos um dia repercutiu enormemente no tipo de adulto que somos hoje. Dizem que a infância é o rascunho do que seremos, e este rascunho influencia o texto todo. Este rascunho influencia todo o estilo. Este rascunho é, muitas vezes, o melhor que temos de nós. Somos os rastros do menino que fomos. Somos suas pegadas lá atrás. A infância, a memória da criança que fomos, sempre andará junto do adulto que somos, para o bem ou para o mal. Como levar nossa vida de adulto sem influência da criança que fomos? Ou melhor, como queremos lidar com esta carga enorme que cai nos nossos ombros de adulto sem pegar emprestado a leveza da criança que fomos um dia? A responsabilidade de educar, as contas a pagar, o pão do dia a dia que temos que conseguir com nosso suor, as frustrações, os sonhos inalcançados, a busca do equilíbrio, a busca da sanidade! Como podemos lidar com esta carga toda se não lembrarmos de nós mesmos quando crianças, do tempo em que acreditávamos incondicionalmente nos sonhos, do tempo em que as fadas existiam e que nós éramos especiais? Como podemos lidar com esta carga se não prestamos atenção, ou prestamos pouca atenção, naquilo que vimos no caminho que passou?

A grande pergunta é: Quão velhos estamos hoje? Quão distantes estamos da criança que fomos um dia? Este menino que fomos um dia ainda está por aqui, dentro da gente, dentro da nossa memória, influenciando alguns de nossos atos? Ainda encontramos vestígios deste menino dentro de nós? Ou este menino já envelheceu? Nós ainda podemos garimpar este menino dentro desta mina que é nossa memória? Quão distante estamos deste menino? Ainda podemos resgatá-lo? Ainda queremos resgatá-lo? Esta é a criança de quem nunca deveríamos largar a mão: nós mesmos! Porque o menino que fomos um dia é o equilíbrio! O menino que fomos um dia antes da vaidade exacerbada nos engolir, antes do ódio pelos que pensam diferente nos consumir, antes da indiferença e individualismo que permeia o mundo atual nos alcançar. A criança que fomos um dia é o equilíbrio! O menino que fomos! A criança que fomos!

A vida é breve, e penso que temos nesta breve vida, antes da morte definitiva, uma outra morte igualmente importante e traumática: a morte da infância! A infância morre quando percebemos que temos que trocar a pele e assumir nossa forma de adulto. A infância morre quando percebemos que não podemos mais voar, e que nossas palavras e atos passam a ter consequências. A infância morre quando os regressos já não são possíveis. E deveriam ser sempre possíveis! Porque a vida é um constante olhar para trás! A vida segue sempre em frente, mas frequentemente olhamos para trás, principalmente nos momentos difíceis. Olhamos para o lugar de onde viemos, olhamos para nossos pais ainda jovens e ainda com o leme de nosso destino em suas mãos, olhamos para nossa infância, olhamos para a velha casa com quintal, olhamos para nós mesmos, em uma época anterior, onde havia quem sabe mais pureza e leveza.

Queria terminar esta crônica de hoje com a seguinte frase de Fernando Sabino: “Quando eu era menino, os mais velhos perguntavam: o que você quer ser quando crescer? Hoje não perguntam mais. Se perguntassem, eu diria que quero ser menino”. É este menino que aparecerá nos momentos difíceis para nos dar a mão, para lembrar coisas que não deveríamos ter esquecido, para trazer pureza à nossa vida, para nos proteger dos monstros e bruxas. É este menino, o menino que o Fernando Sabino gostaria de ter sido quando cresceu, que nós nunca podemos abandonar! E é apenas por isso tudo que devemos garimpar a infância que ainda há dentro de nós, a infância que nos separa da loucura e da decrepitude…

Sérgio Idelano

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